domingo, 18 de outubro de 2009

A FAMÍLIA TECO-TECO, história da Avómi

Pintura a óleo de Jean Bradbury, da série Weasels Dance, Rabbits Dream
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Ia eu muito contente apanhando pedrinha aqui, florinha ali, olhando as árvores, sorrindo às ervinhas, quando ouvi uma vozinha muito fininha que pedia socorro. Corri para o local donde vinha a voz e deparei-me com um coelhinho que chorava.

- Que te aconteceu, coelhinho?- perguntei-lhe.

- Tive um acidente - respondeu o coelhinho - Parti uma patinha quando fugia dum caçador maroto que queria matar-me, para fazer uma boa almoçarada. O mais grave é que, depois de tanto fugir, não sei onde estou, e não consigo orientar-me para voltar para casa. Os meus pais e irmãos devem estar desesperados.

- Deixa-me ver a tua patinha!... Ah, isto está feio! De certo terás que ir ao veterinário para te tratar e é melhor fazê-lo quanto antes, porque se o não fizeres, podes ficar com a patinha aleijada.

- Terei que ir ao veterinário?! O que é isso?

- O veterinário é um Senhor que trata os animais; é o médico dos animais.

- Ah, nunca tinha ouvido falar!

- Mas o que eu mais queria, era encontrar a minha casa e a minha família. Longe dos meus familiares, sinto-me muito triste.

- Vais dizer-me onde vivem os teus pais e depois de teres a patinha tratada pelo veterinário, levar-te-ei a casa. - disse eu.

- O meu pai é o Senhor Teco-Teco e a minha mãe a Senhora Teco-Teco. A nossa casa é na quinta do Senhor Conde de... Ai que me esqueci do nome do Senhor Conde!... - disse o coelhinho.

- E como se chama a quinta? Se me disseres o nome da quinta e onde fica...

- A quinta fica num Monte e chama-se Quinta da Corticeira.

A nossa toca é muito espaçosa e gostamos muito de lá viver, porque temos sempre ervinhas frescas e aguinha muito limpa, sem precisarmos de ir para longe da toca. A água corre num riacho ali ao pé e faz um barulho tão bonito, que até parece que canta.

- Não te preocupes, que não será difícil encontrarmos os teus pais, pois pelas indicações que me dás, havemos de lá ir ter.

- Que bom! Estou tão desejoso de chegar a minha casa e tão preocupado com os meus pais! Eles devem estar aflitíssimos e muito tristes.

- Então vamos lá visitar o Senhor Dr. Pereira que é um veterinário meu amigo, e ele tratar-te-á cuidadosamente. A tua patinha ficará boa num instante. Vem cá para o meu colo, não quero que te esforces a andar. A tua patinha não deve estar partida, mas sim muito magoada, pois se estivesse partida não poderias andar.

Fomos ao consultório do Dr. Pereira que vive numa aldeia ali perto e ele observou logo a patinha do coelhinho Teco-Teco.

- Isto não é nada de grave. A tua patinha está apenas magoada. Vou pôr-te uma pomadinha e daqui a pouco estarás pronto para uma corrida.

- Obrigado, Senhor Dr. - disse o coelhinho - O Senhor é muito simpático e bom. Se soubesse o susto que apanhei, quando vi aquele caçador a apontar-me a arma!... Nunca tinha corrido tanto na minha vida. A minha sorte foi ter-me magoado quando já estava bastante longe dele, senão!...
Esta amiga socorreu-me e trouxe-me aqui para o Senhor Dr. tratar a minha patinha, pois se assim não fosse estaria ainda no meio do mato, perdido e cheio de dores.

- Onde moras? - perguntou o veterinário.

- Moro na Quinta da Corticeira.

- Essa quinta é muito perto daqui! Estás a ver aquele Monte? É ali a Quinta da Corticeira. Como estás muito cansado e a nossa amiga também deve estar, levá-los-ei no meu carro, para evitar que subam o monte a pé.

- Obrigado, Senhor Dr. Pereira! Estou tão contente por o ter conhecido!
Quando chegar a casa vou dizer aos meus pais que o Senhor é o melhor médico do mundo e, tenho a certeza que a partir de agora, a Família Teco-Teco há-de vir ao seu consultório sempre que houver qualquer problema de saúde.

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segunda-feira, 12 de outubro de 2009

PEDRA FILOSOFAL, poesia de António Gedeão

Fotografia da Terra - NASA



Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.


Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é Cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.
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sábado, 10 de outubro de 2009

A MENINA ALFACINHA, história de Ilona Bastos

Naquele dia, a professora Dina entrou na sala, pousou a pasta em cima da secretária e voltou-se para os alunos com um lindo sorriso:
- Hoje vão ter uma nova colega!

Os meninos agitaram-se nas cadeiras, e o Francisco, o mais atrevido, perguntou:
- Como se chama a nova aluna?

A professora Dina procurou nos papéis, guardados num dossier, hesitou e voltou a sorrir:

- Bom... chama-se Almerinda Etelvina Engrácia Pancrácia da Silva... Mas os amigos tratam-na por Menina Alfacinha.

Toda a turma tornou a dançar sobre os assentos.

- Menina Alfacinha? Mas que nome mais engraçado!

- Já sei porque se chama Alfacinha! - gritou o Pedro, saltando. - É Alfacinha porque nasceu em Lisboa!

A professora Dina abanou a cabeça.

- Não! - disse ela. - A Menina Alfacinha não nasceu em Lisboa, nasceu em Sintra.

- Ah! - exclamou o Manuel. - A menina chama-se Alfacinha porque o seu clube de futebol preferido é o Sporting!

A professora Dina tornou a negar.

- Não! Na verdade, a Menina Alfacinha gosta muito de verde e até aprecia futebol, mas ainda não escolheu pertencer a nenhum clube em especial.

- Então a menina tem esse nome porque é ecologista - afirmou a Mariana, muito séria. - Gosta da Natureza e quer defendê-la.

A professora Dina, mais uma vez, largou a sorrir.

- Com certeza que a Menina Alfacinha gosta da Natureza e quer defendê-la, aliás como todos nós aqui na sala. Mas não é por isso que lhe chamam Menina Alfacinha.

- Diga, diga, professora! - pediram os meninos, em coro. - Porque é que a nova aluna se chama Alfacinha?

A professora Dina, mais do que sorrir, soltou uma verdadeira gargalhada.
- É que a Menina Alfacinha tem o cabelo verde!

Os meninos riram também, incrédulos.

- Ninguém tem o cabelo verde - disse o Rui, agarrado à barriga de tanto rir.

- Tem, tem! - respondeu a professora Dina. - Tem a Menina Alfacinha. Passou debaixo de uma escada, e... vejam lá que grande azar!... Levou com um balde de tinta verde na cabeça!

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